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Leiam OS DIAS DA PESTE!

  • Igor Oliveira
  • 29 de nov. de 2017
  • 4 min de leitura

Em um futuro próximo, bastante parecido com o nosso presente, Arthur Mattos se divide entre as atividades de técnico de computador e professor universitário, no Rio de Janeiro. Sua rotina monótona e solitária começa a mudar quando os chamados de clientes com problemas nos seus computadores começam a ficar mais complexos, e a quantidade desses chamados também aumenta significativamente. Esse é só o começo, a premissa básica de Os Dias da Peste, romance do Fábio Fernandes publicado em 2009 e que está de volta este ano, pela primeira vez em formato digital.


Só o começo mesmo. Os Dias da Peste é muito mais que uma história sobre ocorrências com computadores. É novidade das boas em termos estéticos também. Arthur conta a história das anomalias tecnológicas em forma de blog, e a trama vai evoluindo conforme a gente vai conhecendo mais sobre o protagonista. Sedentário, leitor voraz, fã de um chopinho nos redutos boêmios do Rio, nerd sem afetações, viciado em Coca Zero. Arthur é tudo isso e mais um pouco. Está de saco cheio dos seus dois trabalhos, mas pondera os prós e contras, e vive meio em crise porque só engorda, está prestes a completar 30 anos e não arruma namorada.

Quando o livro foi publicado fisicamente, em 2009, a gente ainda podia falar em futuro, mesmo que bem próximo, já que a primeira parte da história acontece em 2010. O conteúdo da nova edição é quase todo o mesmo da primeira, a não ser por uma nota em que o Fábio faz questão de contar por que manteve as datas como estavam. O livro tem 3 partes, e um intervalo de mais ou menos 3 anos separa cada uma delas. O bacana é que conforme a narrativa vai evoluindo, os formatos mudam, e na terceira parte é como se estivéssemos ouvindo um podcast do Arthur.


Perde toda a graça se eu contar aqui os desdobramentos dessa epidemia de panes em computadores. O que eu recomendo muito é que leiam o livro, porque além de desfrutar de uma boa história vocês vão ver o quanto se pode fazer boa ficção científica sem apelar para os clichês do gênero, e isso é muito por conta do repertório que o Fábio Fernandes tem. Logo que terminei a leitura fiz a ele algumas perguntas sobre essa questão do repertório, e sobre a construção de uma ficção científica calcada na realidade. Resumo aqui o papo que tivemos:

Igor: O quanto do Fábio está no Arthur? Pergunto isso porque tem um aspecto, principalmente relacionado à cultura, aos livros, que eu acho que tem a ver com você. É o lance do Arthur, embora estar dentro do estereótipo nerd e curtir coisas ditas de nerds, também ter interesse e se entusiasmar ao falar de coisas, digamos, não nerds.


Fábio: Todo personagem meu tem um pouco de mim. No caso do Artur ele tem muito de mim, talvez porque ele surgiu originalmente num conto escrito dez anos antes do romance. Eu sempre me preocupo muito em levar minha experiência para os personagens a fim de torná-los mais críveis. E eu estou sempre alternando leituras. Não dispenso um texto de teatro ou poesia para alternar com a prosa, por exemplo, a outros gêneros literários para alternar com a ficção científica.

Igor: Outro aspecto de que gosto demais é o fato de que, embora a história esteja ancorada em elementos futuristas, de tecnologia, etc., o contexto tem uma pegada forte do presente. A casa do Arthur, a faculdade, os botecos onde ele toma chope, tudo tem muito a cara de hoje. Acho que isso dá um ar bem especial ao livro, que aliado à linguagem faz a diferença.


Fábio: Gosto demais de uma ficção científica ou fantástica que se ancore na realidade. Quase todas as minhas histórias seguem essa linha. Acho que tem a ver com a primeira pergunta. Assim como quase todos os meus personagens têm a ver comigo em maior ou menor proporção, os cenários também. Um livro que acabei de ler e que segue a mesma linha é Europe in Autumn, de Dave Hutchinson. Ele imagina uma Europa fragmentada em estados-nações daqui a cerca de 40 anos. Mas quase todos os elementos da narrativa nos são reconhecíveis. Apenas de vez em quando ele joga, por exemplo, um traje camuflado holograficamente ou uma interface sem teclado, e aí nos damos conta de que estamos no futuro. Acho essa técnica muito elegante, e sempre que posso a utilizo também.

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Conheci o Fábio Fernandes há muitos anos. O atendi na Cultura do Villa Lobos, e se não me falha a memória ele procurava as animações de Clone Wars do Genndy Tartakovsky. De lá pra cá venho acompanhando seu trabalho, tanto como escritor quanto tradutor. O Homem do Castelo Alto (Philip K. Dick), 2001 – Uma Odisséia no Espaço (Arthur C. Clarke), Laranja Mecânica (Anthony Burgess) e Neuromancer (William Gibson) estão entre os livros que já traduziu. Fábio também é professor no curso de Tecnologia e Mídias Digitais da PUC-SP, faz leitura crítica e mentoria.


A edição digital de Os Dias da Peste está disponível, por exemplo, na Amazon, bem como o conto Charlotte Sometimes e o recém lançado De A a Z: Dicas para Escritores, em que o autor traz, em forma de verbetes, questões importantes relativas à escrita. Outra coisa: o Fábio é um dos caras que eu faço questão de acompanhar nesse atoleiro de bobagens que é o mundo virtual. Vai por mim, o cara tem o que dizer. A timeline dele no Facebook é leitura obrigatória aqui em casa, todos os dias, e o canal Terra Incógnita, no Youtube, tá com o sininho das notificações ativado pra eu não perder nada.

Os Dias da Peste é prova de que é muito possível fazer ficção científica com bom argumento, sem depender de clichês, e ambientada no Brasil. Leitura obrigatória.













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